STF

RE 574.706: EXCLUSÃO DO ICMS DA BASE DE CÁLCULO DA PIS/COFINS – JULGAMENTO DOS EMBARGOS PELO STF

Por Dr. Iran José de Chaves *

Nos dias de hoje, indiscutivelmente, a tese de maior relevância discutida no STF é aquela relacionada com a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS, cujo alcance preocupa a todos os seguimentos, dês a classe contributiva até o poder tributante e passa, necessariamente, pelos advogados que atuam na área tributária.

A nosso juízo, a modulação é procedimento inescapável, merecendo atenção redobrada apenas quanto aos seus efeitos, o que causa a todos visível preocupação e desassossego, posto que pode, de forma infringente, atingir a prestação jurisdicional entregue em 2017. Nele, o STF deve fincar as tendências na modulação em matéria tributária e pode colocar à sociedade e ao mercado incertezas econômicas, jurídicas e administrativas que surgiram após a publicação do acórdão relatado pela Ministra Cármen Lúcia.

Tantas lacunas surgiram porque, ainda que a discussão do mérito do Recurso Extraordinário 574.706 (tema 69) tenha ocorrido há quatro anos, os embargos interpostos pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) trouxeram uma reviravolta no caso.

O poder tributante insiste que o STF se posicione sobre questão incontroversa, relacionada com o critério de cálculo da parcela do ICMS passível de ser excluída da base de cálculo do PIS e da COFINS. Será debatido se o imposto a ser retirado é o destacado na nota fiscal ou o efetivamente pago pelo contribuinte. A última hipótese, na prática, diminuiria a parcela de ICMS retirada da base de cálculo do PIS e da COFINS, comprometendo de fora inarredável o sucesso dos contribuintes explicitados na decisão de 2017.

O pleito da Fazenda não fica só nisso: ela pede mais, postula que os efeitos do infringente não sejam retroativos e passem a valer somente a partir da data do julgamento dos embargos. O órgão julgador máximo foi chamado a decidir – nos embargos aclaratórios – se os efeitos valerão ressalvadas ou não as ações ajuizadas e os valores pagos, e se a modulação vale a partir de 2017 (data do julgamento do mérito) ou a partir de maio de 2021 (data de julgamento dos embargos).

Não há como ignorar que o reflexo da perda da receita pública poderá servir de balizador para o advento de uma decisão desfavorável ao contribuinte, cujo desiderato atingirá direta e frontalmente a prestação jurisdicional entregue ainda em 2017, quando a questão foi apreciada e julgada pelo STF. A Fazenda, de forma ostensiva – e sem nada provar – alardeia que o Fisco terá uma perda de receita de aproximadamente R$ 258 milhões.

A classe contributiva, via seus órgãos de representação de classe, dentre os quais se destacam a CNI e a CNC, sustenta que caso prospere a modulação nos moldes postulados no aclaratório, seria provocada a repercussão negativa na já combalida segurança jurídica das normas constitucionais, com reflexo do refreio de investimentos nacionais e internacionais. A retomada da economia e a geração de empregos seriam atingidas mortalmente agravando, ainda mais, a frágil esperança de uma recuperação pós pandemia.

A insistência do Fisco não é nova! Ainda em 2018, menos de 20 meses após o histórico julgamento de 2017, a Receita Federal divulgou a Solução de Consulta Interna (Cosit) nº 13, de 18/10/2018, segundo a qual “o montante a ser ‘excluído’ da base de cálculo mensal da contribuição é o valor mensal do ICMS a recolher” e assim o fez antes mesmo da análise da tese reeditada nos aludidos embargos, atribuindo de forma transversa, efeito vinculante de uma interpretação proferida a latere do acórdão prolatado no RE 574.706. Essa orientação foi, lamentavelmente, recepcionada pelo CARF em alguns julgados reacendendo, com isso, novos debates sobre matéria já analisada e julgada pela nossa Suprema Corte.

Insista-se: O acórdão proferido em 2017 nos autos do RE 574.706, NÃO prevê nenhuma limitação temporal ou material sobre a exclusão da base de cálculo do PIS/COFINS. Além disso, via de regra as decisões de inconstitucionalidade possuem efeito retroativo. Se improvidos forem os embargos, não haverá modulação e o direito a repetição será de rigor, podendo as empresas buscarem a restituição do indébito via compensação ou precatório, dos cinco anos anteriores à propositura de cada ação, ex vi da LC. 118/2005. Para as ações propostas antes da referida lei, será aplicada a tese dos cinco anos do ocorrido mais cinco anos anteriores. (REsp. 1.269.570/MG).

A Fazenda se utiliza do impacto que essa decisão poderá provocar aos cofres públicos, com uma perda significativa de receitas. Ora, não se concebe à luz de um raciocínio lógico, que a decisão do STF tenha feição econômica e não jurídica. O Judiciário deve apreciar a matéria à luz da constituição, aplicando a norma certa e provada aos fatos denunciados no RE sub análise. A decisão é única e não cabe controvérsias. É fundamental que a interpretação dos fatos persiga o direito consagrado no julgamento ocorrido em 13 de março de 2017, mantendo intangível o acórdão da lavra da Ministra Cármen Lúcia, sob pena de atingir direito fundamental expresso dos jurisdicionados.

Por outra banda, a diferenciação no ICMS feita pela Fazenda, não encontra ressonância dentre aqueles que operam com direito tributário, ao argumento de que essa distinção: se é pago ou destacado não existe. Isso é uma pretensa criatura instituída pelo criador sem consistência alguma. Essa tresloucada tese, teve advento com o intuito deliberado de justificar o prosseguimento dos debates, cujo intuito é eternizar a pendenga judicial, criando obstáculos a apropriação do crédito de origem comprovada.

Em verdade, nunca se discutiu nesta tese o imposto estadual. Prova disso é que a matéria discutida em sede de ações ordinárias e mandados de segurança, sempre tramitaram na Justiça Federal e nos processos nunca se travou qualquer debate sobre a origem e nem tampouco sobre a sistemática de apuração do ICMS. O que se discutia era a receita da contribuinte. A ideia central é de que o faturamento não comporta o ICMS incidente sobre a operação, não mais que isso. Esse sempre foi o busílis da controvérsia instaurada nos pleitos submetidos a apreciação do judiciário. Nada além disso.

Este signatário, integrante do escritório Chaves de Advocacia, fez um quadro analítico, em que as alíquotas de ICMS seriam as mesmas durante a cadeia de operações e desconsiderando o eventual acúmulo de créditos de ICMS no recolhimento mensal. Por esse exemplo, considerando o total das operações de R$ 9.000,00 construiu o seguinte resultado:

No primeiro contexto, se o ICMS integra a base de cálculo do PIS e da COFINS, a base é de R$ 9.000,00 e o valor a ser recolhido é de R$ 328,00. No segundo cenário, se for excluído o ICMS destacado, a base de cálculo cai de R$ 9.000,00 para R$ 7.380,00 e o valor recolhido dos tributos será de R$ 269,37. No terceiro cenário, tem-se a exclusão do ICMS pago da base de cálculo do PIS/COFINS, aqui a base de cálculo será R$ 8.100,00 e o valor a ser recolhido será de R$ 295,65.

Ao arremate, conclui-se que a Fazenda, no afã de justificar o injustificável, busca, desesperadamente, trechos do acórdão embargado para sustentar que a apropriação do crédito deve obter os valores do ICMS pago e não o destacado. A unanimidade dos tributaristas, expressam resistência contra esse pleito e aponta a inegável existência de malícia do fisco, justamente porque omite pontos relevantes do acórdão que apontam na direção da constatação implícita que o ICMS a ser utilizado para exclusão da base de cálculo do PIS e da COFINS é o imposto destacado, tudo o mais não passa de firulas arquitetadas por quem não tem compromisso com a verdade, cujo intuito é apenas arrecadar, não se importando com a forma e os meios utilizados.

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* Advogado, inscrito na OAB/SC sob o n. 3.232, sócio-diretor do Escritório Chaves de Advocacia. Graduado em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. Pós-graduado em nível de especialização em Direito Tributário pela UFSC. Pós-graduado em nível de especialização em Direito Empresarial pela ESAG/UDESC.